segunda-feira

Trauteava rock em teclas dum piano clássico, enorme!


Passava os dedos como quem toca teclas de piano no muro alto 
Cantarolava baixinho porque não sabia cantar alto 
Os dedos davam-lhe as notas imaginadas, os murmúrios confortavam-lhe apertos na garganta . 

Olhava o muro alto, lá em baixo uma praia de pescadores, sempre a assustou aquele muro desequilibrado, nem percebe como ninguém cai dali abaixo, nem percebe como alguém caí assim …de si abaixo !
Tocava um piano imaginário , fazia sons de garganta .

Lembrava a praia , a areia molhada numa noite fria …quantos anos ? .. vinte ? …mais …talvez trinta ...

Lembrou barcos de pesca com pescadores encardidos do sol e do salitre , histórias de marés e de raia miúda , conversas noite fora , encostados a cascos frios… lembrou-se do “Mar à Vista” ….

Passeava encostada àquele muro que nunca entendeu , tocava as notas que sempre gostou de ouvir . E aquela cor , aquela cor de pescadores, encardidos de salitre, aquela cor, que se esbatia na sua memória, não lhe saía da cabeça .

Trauteava rock em teclas dum piano clássico, enorme! Desenhado por ela naquele muro baixo, desequilibrado, perdido no tempo amargurado , agora parecia-lhe tão pequeno , tão perigoso ….sentiu aqueles grãos de areia grossa, húmida, fria, sentiu-a assim, no final dos tornozelos …lembrou-se que era assim ...

Hoje dia estava mais cinzento. Ali, o tempo sempre foi cinzento… naquele dia, o cheiro do peixe fresco agoniou-a, impotente ao tempo …naquele dia as pedras grandes, da calçada que pisava , torceram-lhe os pés ….!!

Tocava piano, em teclas enormes, sem som, deixou de gargarejar sons antigos. Não pares de cantar , nem que seja baixinho, não te cales, não adormeças esses grãos frios de areia grossa , naquela noite gelada , tão passada…
Naquele dia, ali, mesmo ao cimo da praia dos pescadores, a tristeza do que nunca foi , toldou-lhe a voz , embaciou-lhe o olhar !

Torceu-lhe os pés !

Teresa Maria Queiroz - 1 de Agosto 2011



2 comentários:

Paulo Roberto Wovst Leite disse...

Oi Teresa!

Às vezes apenas resta tristemente ponderar, limpando as cinzas que ficaram em volta...

Abraços.

armalu,blogspot.com disse...

Muitas vezes, é mexendo no baú das memorias que sobrevivemos, umas mais antigas outras nem tanto. Adorei o teu texto. Essa melancolia, esse sentir, esse querer, mexeu comigo.Abraço amigo.